Publicado
no DIAP em 12 Março 2014
Maria
Cristina Fernandes*
Se um maior número de eleitores se diz disposto a anular sua opção
para presidente ou votar em branco, diminui a cesta de votos válidos a partir
da qual se conta a maioria necessária para que se liquide a fatura no primeiro
turno.
►Desde que inventaram eleição em dois turnos no Brasil dela só
escapou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, tanto em 1994 quanto em
1998. Em nenhuma das três eleições posteriores o PT foi capaz de chegar à
maioria absoluta dos votos para liquidar a fatura de uma só vez.
►Num momento em que pemedebistas e petistas deixados ao relento,
além de empresários e banqueiros queixosos, só se ocupam do "volta
Lula", a aposta de que a reeleição da presidente Dilma Rousseff pode
repetir a façanha de FHC parece uma alucinação.
A aposta tem nome e
endereço e está a léguas, em distância e propósito, do quartel-general da
campanha presidencial. Chama-se Alexandre Marinis, foi analista do banco Garantia e hoje tem uma
consultoria que se dedica a esquadrinhar a política em números para seus
clientes.
O ponto de partida são
as manifestações de junho do ano passado. Duas pesquisas Datafolha feitas antes
e depois de as ruas se encherem mostram que o
percentual de eleitores dispostos a dar um voto em branco ou anulá-lo havia
mais do que duplicado.
Até o início de junho o
patamar se mantinha no limite padrão de 7%. A partir das manifestações, esse
percentual cresceria a ponto de chegar a 18% na última rodada de fevereiro.
Se um maior número de
eleitores se diz disposto a anular sua opção para presidente ou votar em
branco, diminui a cesta de votos válidos a partir da qual se conta a maioria
necessária para que se liquide a fatura no primeiro turno.
A remissão às duas
eleições de FHC é obrigatória. De cada dez eleitores que compareceram para votar em 1994 e 1998, oito
validaram seus votos. O ex-presidente elegeu-se com metade desses votos.
Na era petista o
sarrafo aumentou. Caiu o percentual de nulos, muito provavelmente por causa da
universalização da urna eletrônica. Os votos nulos sempre foram maiores em
cidades com maior número de analfabetos. A urna eletrônica facilitou o voto
dessas pessoas.
Com isso, de cada dez eleitores que
compareceram aos locais de votação nas três últimas disputas presidenciais nove validaram seus votos.
Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma precisavam fazer uma metade mais robusta de
votos que a de FHC. Falharam e acabaram
enfrentando um segundo turno.
A julgar por todas as
pesquisas desde as manifestações, o patamar de nulos estará mais próximo
daquele observado nas eleições de FHC do que na dos petistas, o que embasa as
convicções de Marinis sobre as chances de um único turno em outubro.
Além das evidências
aritméticas, as pesquisas revelam que o alheamento prejudica a oposição porque
tira do mercado os eleitores mais oposicionistas do pedaço. É duas vezes mais
fácil encontrar um eleitor que aprova governo Dilma entre aqueles que pretendem
escolher o senador Aécio Neves ou o governador Eduardo Campos do que entre
aqueles que pretendem votar em branco ou nulo.
A entrada da ex-senadora Marina Silva como vice
de Campos ou mesmo como candidata melhora as chances do PSB, mas não reduz o
alheamento eleitoral.
Tanto Campos quanto
Aécio devem torcer por candidaturas que ajudem a captar esse voto nulo. Se o
pré-candidato do PSOL, o senador Randolfe Rodrigues (AP), começar a ser ouvido
pelos desencantados pode ajudar a oposição. O mesmo talvez não possa ser dito
se o ministro Joaquim Barbosa resolver disputar e, além dos alheios, roubar os
votos da oposição.
O alheamento acendeu o
sinal amarelo no Tribunal Superior Eleitoral, que prepara campanha
institucional sobre a importância do voto. èAo
contrário de outras, de teor mais educativo e voltada para grotões analfabetos,
esta, com um apelo mais cívico, buscará o eleitor das grandes cidades.◄
Desde as massivas demonstrações de junho, os protestos
reduziram-se em escopo, mas não é só quem solta rojão que se afasta da urna. A
violência gerada por ambos os lados e seu noticiário inflam a descrença na
política institucional.
A despeito do empenho
do governo em aprovar lei contra os rojões, as manifestações, pelo que mostram
as contas de Marinis, podem acabar ajudando a reeleição. ►À dura tarefa de
conquistar quem quer votar, soma-se aos percalços da oposição a façanha de
arrebanhar os alheios.
Alfio Bogdan
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