Nós,
brasileiros, somos capazes de sonegar meio trilhão de reais de Imposto de Renda
só no ano passado. Como somos capazes de vender e comprar DVDs piratas, cuspir
no chão, desrespeitar o sinal vermelho, andar pelo acostamento e, [ainda por
cima, votar no Collor, no Maluf, no Newtão Cardoso, na Roseana, no Marconi
Perillo ou no Palocci].
O
panelaço nas varandas gourmet de ontem não foi contra a corrupção. Foi contra o
incômodo que a elite branca sente ao disputar espaço com esta gente
diferenciada que anda frequentando aeroportos, congestionando o trânsito e
disputando vaga na universidade.
Elite
branca que não se assume como tal, embora seja elite e branca. Como eu sou.
Elite branca, termo criado pelo conservador Cláudio Lembo, que dela faz parte,
não nega, mas enxerga.
Como
Luís Carlos Bresser Pereira, fundador do PSDB e ex-ministro de FHC, que disse:
“Um
fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio político, o espírito golpista
dos ricos contra os pobres. O pacto nacional popular articulado pelo PT
desmoronou no governo Dilma e a burguesia voltou a se unificar. Surgiu um
fenômeno nunca visto antes no Brasil, um ódio coletivo da classe alta, dos
ricos, a um partido e a um presidente. Não é preocupação ou medo. É ódio.
Decorre do fato de se ter, pela primeira vez, um governo de centro-esquerda que
se conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se entregou. Continuou
defendendo os pobres contra os ricos. O governo revelou uma preferência forte e
clara pelos trabalhadores e pelos pobres. Nos dois últimos anos da Dilma, a
luta de classes voltou com força. Não por parte dos trabalhadores, mas por
parte da burguesia insatisfeita. Quando os liberais e os ricos perderam a
eleição não aceitaram isso e, antidemocraticamente, continuaram de armas em
punho. E de repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo.”
Nada
diferente do que pensa o empresário também tucano Ricardo Semler, que ri quando
lhe dizem que os escândalos do mensalão e da Petrobras demonstram que jamais se
roubou tanto no país.
“Santa
hipocrisia”, disse ele. “Já se roubou muito mais, apenas não era publicado, não
ia parar nas redes sociais”.
Sejamos
francos: tão legítimo como protestar contra o governo é a falta de senso do
ridículo de quem bate panelas de barriga cheia, mesmo sob o risco de riscar as
de teflon, como bem observou o jornalista Leonardo Sakamoto.
Ou
a falta de educação, ao chamar uma mulher de “vaca” em quaisquer dias do ano ou
no Dia Internacional da Mulher, repetindo a cafajestagem do jogo de abertura da
Copa do Mundo.
Aliás,
como bem lembrou o artista plástico Fábio Tremonte: “Nem todo mundo que mora em
bairro rico participou do panelaço. Muitos não sabiam onde ficava a cozinha”.
Já
na zona leste, em São Paulo, não houve panelaço, nem se ouviu o pronunciamento
da presidenta, porque faltava luz na região, como tem faltado água, graças aos
bons serviços da Eletropaulo e da Sabesp.
Dilma
Rousseff, gostemos ou não, foi democraticamente eleita em outubro passado.
Que
as vozes de Bresser Pereira e Semler prevaleçam sobre as dos Bolsonaros é o
mínimo que se pode esperar de quem queira, verdadeiramente, um país mais justo
e fraterno.
E
sem corrupção, é claro!
Alfio Bogdan - Físico e Professor.
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