segunda-feira, 9 de março de 2015
dan2010: O panelaço da barriga cheia e do ódio
dan2010: O panelaço da barriga cheia e do ódio: Nós, brasileiros, somos capazes de sonegar meio trilhão de reais de Imposto de Renda só no ano passado. Como somos capazes de vender e co...
O panelaço da barriga cheia e do ódio
Nós,
brasileiros, somos capazes de sonegar meio trilhão de reais de Imposto de Renda
só no ano passado. Como somos capazes de vender e comprar DVDs piratas, cuspir
no chão, desrespeitar o sinal vermelho, andar pelo acostamento e, [ainda por
cima, votar no Collor, no Maluf, no Newtão Cardoso, na Roseana, no Marconi
Perillo ou no Palocci].
O
panelaço nas varandas gourmet de ontem não foi contra a corrupção. Foi contra o
incômodo que a elite branca sente ao disputar espaço com esta gente
diferenciada que anda frequentando aeroportos, congestionando o trânsito e
disputando vaga na universidade.
Elite
branca que não se assume como tal, embora seja elite e branca. Como eu sou.
Elite branca, termo criado pelo conservador Cláudio Lembo, que dela faz parte,
não nega, mas enxerga.
Como
Luís Carlos Bresser Pereira, fundador do PSDB e ex-ministro de FHC, que disse:
“Um
fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio político, o espírito golpista
dos ricos contra os pobres. O pacto nacional popular articulado pelo PT
desmoronou no governo Dilma e a burguesia voltou a se unificar. Surgiu um
fenômeno nunca visto antes no Brasil, um ódio coletivo da classe alta, dos
ricos, a um partido e a um presidente. Não é preocupação ou medo. É ódio.
Decorre do fato de se ter, pela primeira vez, um governo de centro-esquerda que
se conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se entregou. Continuou
defendendo os pobres contra os ricos. O governo revelou uma preferência forte e
clara pelos trabalhadores e pelos pobres. Nos dois últimos anos da Dilma, a
luta de classes voltou com força. Não por parte dos trabalhadores, mas por
parte da burguesia insatisfeita. Quando os liberais e os ricos perderam a
eleição não aceitaram isso e, antidemocraticamente, continuaram de armas em
punho. E de repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo.”
Nada
diferente do que pensa o empresário também tucano Ricardo Semler, que ri quando
lhe dizem que os escândalos do mensalão e da Petrobras demonstram que jamais se
roubou tanto no país.
“Santa
hipocrisia”, disse ele. “Já se roubou muito mais, apenas não era publicado, não
ia parar nas redes sociais”.
Sejamos
francos: tão legítimo como protestar contra o governo é a falta de senso do
ridículo de quem bate panelas de barriga cheia, mesmo sob o risco de riscar as
de teflon, como bem observou o jornalista Leonardo Sakamoto.
Ou
a falta de educação, ao chamar uma mulher de “vaca” em quaisquer dias do ano ou
no Dia Internacional da Mulher, repetindo a cafajestagem do jogo de abertura da
Copa do Mundo.
Aliás,
como bem lembrou o artista plástico Fábio Tremonte: “Nem todo mundo que mora em
bairro rico participou do panelaço. Muitos não sabiam onde ficava a cozinha”.
Já
na zona leste, em São Paulo, não houve panelaço, nem se ouviu o pronunciamento
da presidenta, porque faltava luz na região, como tem faltado água, graças aos
bons serviços da Eletropaulo e da Sabesp.
Dilma
Rousseff, gostemos ou não, foi democraticamente eleita em outubro passado.
Que
as vozes de Bresser Pereira e Semler prevaleçam sobre as dos Bolsonaros é o
mínimo que se pode esperar de quem queira, verdadeiramente, um país mais justo
e fraterno.
E
sem corrupção, é claro!
Alfio Bogdan - Físico e Professor.
domingo, 8 de março de 2015
Leonardo Boff e o ódio ao PT....
Há um fato espantoso, mas analiticamente explicável: o aumento
do ódio e da raiva contra o PT. Esse fato vem revelar o outro lado da
“cordialidade” do brasileiro, proposta por Sérgio Buarque de Holanda: do mesmo
coração que nasce a acolhida calorosa, vem também a rejeição mais violenta. Ambas
são “cordiais”: as duas caras passionais do brasileiro.
Esse ódio é induzido pela mídia conservadora e por aqueles
que na eleição não respeitaram rito democrático: ou se ganha ou se perde. Quem
perde reconhece elegantemente a derrota e quem ganha mostra magnanimidade face
ao derrotado. Mas não foi esse comportamento civilizado que triunfou. Ao
contrário: os derrotados procuram por todos os modos deslegitimar a vitória e garantir
uma reviravolta política que atendesse a seu projeto, rejeitado pela maioria
dos eleitores.
Para entender, nada melhor que visitar o notório historiador,
José Honório Rodrigues que em seu clássico Conciliação
e Reforma no Brasil (1965) diz com palavras que parecem atuais:
”Os liberais no império, derrotados nas urnas e afastados do
poder, foram se tornando além de indignados, intolerantes; construíram uma
concepção conspiratória da história que considerava indispensável a intervenção
do ódio, da intriga, da impiedade, do ressentimento, da intolerância, da
intransigência, da indignação para o sucesso inesperado e imprevisto de suas
forças minoritárias” (p. 11).
Esses grupos prolongam as velhas elites que da Colônia até
hoje nunca mudaram seu ethos. Nas palavras do referido autor: “a maioria foi
sempre alienada, antinacional e não contemporânea; nunca se reconciliou com o
povo; negou seus direitos, arrasou suas vidas e logo que o viu crescer lhe
negou, pouco a pouco, a aprovação, conspirou para colocá-lo de novo na
periferia, no lugar que continua achando que lhe pertence”(p.14 e 15). Hoje as
elites econômicas continuam a abominar o povo. Só o aceitam fantasiado no
carnaval. Mas depois tem que voltar ao seu lugar na comunidade periférica
(favela).
Lamentavelmente, não lhes passa pela cabeça que “as maiores
construções são fruto popular: a mestiçagem racial, que criava um tipo adaptado
ao país; a mestiçável cultural que criava uma síntese nova; a tolerância racial
que evitou o descaminho dos caminhos; a tolerância religiosa que impossibiltou
ou dificultou as perseguições da Inquisição; a expansão territorial, obra de
mamelucos, pois o próprio Domingos Jorge Velho, devassador e incorporador do
Piauí, não falava português; a integração psico-social pelo desrespeito aos preconceitos
e pela criação do sentimento de solidariedade nacional; a integridade
territorial; a unidade de língua e finalmente a opulência e a riqueza do Brasil
que são fruto do trabalho do povo. E o que fez a liderança colonial (e
posterior)? Não deu ao povo sequer os beneficios da saúde e da educação, o que
levou Antônio Vieira a dizer:’Não sei qual lhe faz maior mal ao Brasil, se a
enfermidade, se as trevas”(p. 31-32).
A que vêm estas citações? Elas reforçam um fato histórico
inegável: com o PT, esses que eram considerados carvão no processo produtivo
(Darcy Ribeiro) e o rebotalho social, conseguiram, numa penosa trajetória, se organizar
como poder social que se transformou em poder político no PT e conquistar o
Estado com seus aparelhos. Apearam do poder, pelo voto, as classes dominantes;
não ocorreu simplesmente uma alternância de poder mas uma troca de classe
social, base para um outro tipo de política. Tal saga equivale a uma autêntica
revolução social, pacífica e de cunho popular.
Isso é intolerável para as classes poderosas que se acostumaram
a fazer do Estado o seu lugar natural e de se apropriar privadamente dos bens
públicos pelo famoso patrimonialismo, denunciado por Raymundo Faoro.
Por todos os modos e artimanhas querem ainda hoje voltar a
ocupar esse lugar que julgam de direito seu. Seguramente, começam a dar-se
conta de que, talvez, nunca mais terão condições históricas de refazer seu
projeto de dominação/conciliação. Outro tipo de história política dará, finalmente,
um destino diferente ao Brasil.
Para eles, o caminho das urnas se tornou inseguro pelo nível
crítico alcançado por amplos estratos do povo que rejeitaram seu projeto político
de alinhamento neoliberal ao processo de globalização, como sócios dependentes
e agregados. O caminho militar será hoje impossível dado o quadro mundial
mudado. Cogitam com a esdrúxula possibilidade da judicialização da política,
contando com aliados na Corte Suprema que nutrem semelhante ódio ao PT e sentem
o mesmo desdém pelo povo.
Através deste expediente, poderiam lograr um impeachment da primeira mandatária da nação. É um caminho conflituoso pois a
articulação nacional dos movimentos sociais tornaria arriscado este intento
e talvez até inviável.
O ódio contra o PT é menos contra PT do que contra o povo
pobre que por causa do PT e de suas políticas sociais de inclusão, foi tirado
do inferno da pobreza e da fome e está ocupando os lugares antes reservados às
elites abastadas. Estas pensam em fazer, com boa consciência, apenas caridade,
doando coisas, mas nunca buscando a justiça social.
Antecipo-me aos críticos e aos moralistas: mas o PT não se
corrompeu? Veja o mensalão? Veja a Petrobras? Não defendo corruptos. Reconheço,
lamento e rejeito os malfeitos cometidos por um punhado de dirigentes. Devem
ser julgados, condenados à prisão e até expulsos do PT. Traíram mais de um
milhão de filiados e principalmente botaram a perder os ideais de ética e de
transparência. Mas nas bases e nos municípios – posso testemunhá-lo em dezenas
de assessorias – vive-se um outro modo de fazer política, com participação
popular, mostrando que um sonho tão generoso não se deixar matar assim tão facilmente:
o de um Brasil menos malvado, mais digno, justo pacífico. As classes dirigentes,
por 500 anos, no dizer rude de Capistrano de Abreu, “castraram e recastraram,
caparam e recaparam” o povo brasileiro. Há maior corrupção histórica do que
esta?
Alfio Bogdan - Físico e Professor.
* Dado a condição de amarração no raciocínio de Boff, eu optei pelo texto na sua integralidade.
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