"Senhores ministros, os jornais de ontem de
todo o planeta publicaram a prisão do ex-presidente Nicolas Sarkozy, da França.
Esta prisão teria ocorrido para que os agentes do Estado, encarregados da
investigação criminal, pudessem ouvir aquele que foi por duas vezes presidente
da República — que no passado foi modelar, e, através do iluminismo, exportou
liberdade e democracia para o mundo — para que ele pudesse ser ouvido em um
inquérito, numa indagação que versava sobre recursos de contribuição de
campanha.
Dei-me, então, conta de que esta maré montante de
autoritarismo que se hospeda em determinado setores da burocracia estável do
Estado não é um fenômeno que ocorre apenas em território brasileiro.
Preocupantemente, isto está sucedendo em todo o planeta.
Na França não se pode conhecer o conteúdo das
investigações nem o investigado e nem os seus representantes. Na Itália, o
processo penal está sofrendo um recrudescimento como nunca antes visto. Isto me
preocupa porque a continuarem as coisas como vão, eu não sei qual é o futuro
que nos aguarda. Se ele for assim, confesso aos senhores, que eu não tenho
nenhum interesse em conhecê-lo porque, como disse José Bonifácio, a liberdade e
os princípios libertários são uma coisa que não se perde se não com a vida. É
impossível viver fora de um sistema que não seja um sistema de liberdades.
Inspirado por este acontecimento de ontem, decidi começar
essa peroração trazendo a vossa excelência as palavras ditas por Chrétien
Guillaume de Lamoignon de Malesherbes, que foi um grande jurista francês e
advogado de Luís XVI no julgamento que o conduziu à bastilha e à guilhotina.
Tinha sido ministro do rei e foi o seu advogado, sabia que ia ter de enfrentar
a opinião pública e os jacobinos sedentos de sangue e punição a qualquer preço.
Ele começou a defesa de Luís XVI, perante a corte francesa, dizendo o seguinte:
“Trago à convenção a verdade e a minha cabeça. Poderão dispor da segunda, mas
só depois de ouvir a primeira” [o ministro citou a fala originalmente em
francês]. Eu aqui trago a vossa excelência também duas coisas. São dois
preceitos do nosso ordenamento jurídico democrático.
Um é o artigo 5º inciso 57 da carta política e o outro é
o artigo 283 do nosso Código de Processo Penal. Eles estão sob ameaça de
mortificação e extinção.Trago também, como segunda coisa, a verdade que preciso
dizer sem peias, sem freios, sem receios, e vossas excelências poderão, depois
de ouvir, matar ou não esses preceitos democráticos que aqui estou a defender
na tarde de hoje.
Qual é a origem deste preceito constitucional que
instituiu entre nós a presunção da não culpabilidade ou a presunção da
inocência? Em uma conversa com o eminente ministro Sepúlvela Pertence, ainda na
noite passada, nos lembramos de que esse princípio constitucional que nós
conseguimos introduzir na nossa lei máxima tem origem na legislação eleitoral.
Porque a ditadura militar, o autoritarismo que nós vivemos em um passado não
muito remoto, considerava fator impeditivo de elegibilidade — de ser sujeito
ativo eleitoralmente — aquele que tivesse contra si uma denúncia recebida.
Vejam,
vossas excelências, a simetria. Quando, na Constituinte de 87, na Constituição
de 88, nós escrevemos o plexo de direitos que compõem o capítulo dos direitos e
garantias individuais e coletivos, nós procuramos positivar no texto nobre da
mais alta hierarquia legislativa do nosso país essas garantias para que nós
pudéssemos ter um instrumental necessário para repelir as investidas do
autoritarismo, vestisse ele verde-oliva ou envergasse a cor negra da asa da
graúna.
De
onde vier será repelido, porque nós brasileiros não aceitamos viver sob o tacão
autoritário de quem quer que seja. E, por essa razão, é que nós escrevemos a
carta política que antes do trânsito em julgado nenhum cidadão pode ser
considerado culpado. Isto significa que aconteceram grandes discussões a
respeito sobre se isso eliminaria as prisões, as custódias cautelares, as
custódias temporárias e etc. Mas, não. Não há incompatibilidade.
Há
incompatibilidade em pretender-se dar início à execução de uma pena encontrada
numa sentença que não se tornou imutável. Esta é a discussão que aqui se faz.
Não só pela dicção do artigo 5º, parágrafo 57, da Constituição, mas também pelo
artigo 383 do nosso Código de Processo Penal que espelhadamente reflete esse
dispositivo constitucional.
E
o que é que nós temos nesta impetração de hoje, em que há uma certa volúpia em
encarcerar um ex-presidente da República? Não que o presidente da República
seja um cidadão diferente de qualquer outro, não é, ele não está acima da lei.
Ninguém pode estar acima da lei, mas ninguém pode ser subtraído à sua proteção.
Ninguém pode ser retirado da proteção do ordenamento jurídico.
E
o que é que nós temos aqui? Nós temos aqui uma decisão do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região que confirmou decisão condenatória proferida em 1ºgrau e
que dispôs expressamente o seguinte: de acordo com a Súmula 122 desta corte
regional, esgotada a jurisdição em série de revisão neste tribunal regional,
expeça-se ordem de prisão e oficie-se o juiz com base nesta Súmula 122.
E
o que diz essa súmula? Ela não diz o que se encontrou aqui nesta Suprema Corte,
que em determinado casos, antes do trânsito em julgado há possibilidade do
início da execução da pena. Não! Essa Súmula 122 é inconstitucional, senhores
ministros, porque ela diz que é obrigatório o início da execução da pena. Coisa
que contraria frontalmente a Constituição e o artigo 383 do CPP, e que
contraria a decisão tomada aqui nessa casa que apenas acenou com a
possibilidade.
Vossas
excelências, proponho eu que deveriam declarar inconstitucional essa súmula.
Não só pelo que ela contraria da Constituição, no sentido de dar início à
execução da pena, mas porque ela transforma esse início da execução em
obrigatório, contra a letra da constituição.
Quando eu vejo, senhores ministros, os tribunais — e peço
vênia para dizer isso com o mais elevado respeito — entrarem a legislar, eu
sinto uma frustração enorme. Eu sinto a sensação de eu perdi anos na Câmara dos
Deputados quando fui parlamentar, a trabalhar em uma coisa inútil, porque as
leis que nós elaboramos lá são substituídas por exegeses que as mortificam e
que, às vezes, têm o desplante de contrariá-las, substituindo-as por
mirabolâncias exegéticas que fazem revirar no túmulo o senhor Charles-Louis de
Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu, tal o grau do grau da sem cerimônia
com que se invadem atribuições dos outros poderes para atender a não sei que
inclinações. A voz das ruas? Mas a voz das ruas pertencem às ruas. Quem tem que
manter a mão no pulso da sociedade das ruas não é o poder judiciário, é o
parlamento. São os políticos que têm que captar os anseios e os batimentos da
população e da turba, por que não dizer, e interpretá-los e transformá-los em
normas.
Não é dado ao poder judiciário — e digo isso como
brasileiro — nem daqui e nem de nenhum lugar do mundo, entrar a legislar para
atender a este ou aquele pragmatismo, a esta ou aquela conveniência social de
ocasião.
Senhores, eu pergunto como seria possível nós denegarmos
esta ordem de habeas corpus. Está caracterizado o constrangimento ilegal em
potência iminente. Tem dada marcada. A prisão está marcada para o dia 26 de
março. Foi a data em que se marcou o julgamento dos embargos de declaração e já
está decidido: julgados os embargos de declaração, esgotou-se a jurisdição,
mandado de prisão nos termos da súmula 122.
Agora, eu pergunto a vossas excelências, se nós temos na
casa duas ações diretas de constitucionalidade, de que é relator o eminente
ministro Marco Aurélio, e se este Plenário declarar a constitucionalidade do
artigo 383 do CPP, como é que nós vamos justificar a prisão de um ex-presidente
da República por um esquito, uma vacilação? Por que esse açodamento em prender?
por que esta volúpia em encarcerar? O que justifica isso se não a maré montante
da violência da autoridade, se não a maré montante da volúpia do
encarceramento?
Três anos atrás, em um evento da Ordem dos Advogados do
Brasil, nós já tínhamos dito isso: se o judiciário não entender pela ciência,
pela razão, pela racionalidade, que o encarceramento em massa é uma política
desastrosa, vai ter que engolir essa realidade pela necessidade econômica
que a superpopulação carcerária acarreta. Nós não podemos querer resolver
todos os problemas.
Agradeço e peço que
seja concedida a ordem para o efeito de se determinar que se aguarde pelo menos
o julgamento das duas ações direta de constitucionalidade, se não for aguardar
o trânsito em julgado. Muito obrigado" https://www.youtube.com/watch?v=IYH3oqyjm4g
Alfio Bogdan - Físico e Professor
Excelente, caro Alfio! Muito embora o juridiquês, entendemos perfeitamente a volúpia dessa gente mancomunada com a direita em fazer justiça com as próprias mãos e prender nosso comandante. . .
ResponderExcluirO MUNDO SABE QUE O Sarkozy É UM CRIMINOSO CONTRA O POVO, A FAVOR DA CORRUPÇÃO. O LULA É "Hors concours em toda sua carreira. A sustentação oral de Batochio, SEM PROVAS, na defesa de Lula: "E UMA VERDADEIRA OBRADA PRIMA NO DIREITO ATUAL. Que não suporta mais, o Luiz X disse, Calvino desdisse, Charles-Louis de Secondat sado masoquista corrupto, geraram todo este palavreado, em meio a grandes roubos, Alfio preste a atenção nas provas, eles, estes intelectuais pagos pelos poderosos foram os quem inventaram a propina tal qual os jornalista sem caráter da atualidade deram continuidade. A voz das ruas pertencem ao Povo que revida sem forças aos oligarcas. Enfim, sobraram as obras de arte no pincel calado dos artistas.
ResponderExcluirEm tempo: Habeas Corpus Preventivo
Esse tipo de habeas corpus é concedido apenas em uma situação de ameaça à liberdade de locomoção de uma pessoa, que não tenha sido condenada, por isso ele é chamado de preventivo. Neste caso, ainda não há um fato consumado, é apenas para prevenir quando alguém está sendo coagido ou ameaçado, então, o juiz expede um salvo-conduto. Como o réu em pauta tem sua liberdade ameaçada se foi condenado a mais de 10 anos em regime fechado? Certo está o Vianinha em : Chapetuba Futebol Clube - Funarte
www.funarte.gov.br/vianninha/autorobra_chapetuba.html
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Como informa Maria Silvia Betti, no livro Artistas brasileiros: Oduvaldo Vianna Filho ( São Paulo: Edusp/Fapesp, 1997), Chapetuba Futebol Clube é a primeira peça de Vianinha a apresentar a característica por excelência de seus textos: a utilização de protagonistas divididos entre uma “boa” e uma “má” consciência. zean.