sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

nova visão

POR QUE LIBERTAR CESARE?

Lucas Rafael Chianello, além da grande mídia.

Ao longo do tempo, foram inúmeras as aberrações jurídicas sofridas pelo ex-ativista e escritor italiano Cesare Battisti, que se encontra detido no presídio da Papuda, em Brasília. Aqueles que indiscriminadamente lhe dão como líquida e certa a personalidade de assassino e terrorista desconhecem ou não dão importância aos erros propositais contra ele cometidos.

Quando Cesare se inseriu na militância de esquerda italiana, nos últimos anos da década de 60, conheceu e se tornou amigo de Pietro Mutti. Entretanto, após diversos acontecimentos que inclusive levaram à dissolução do PAC (Proletários Armados pelo Comunismo), o mesmo Pietro Mutti delatara premiadamente Cesare Battisti por ele ter se recusado a participar de ações armadas. Eram os chamados anos de chumbos, nos quais o poder judiciário italiano adotou medidas de tribunais de exceção sob a justificativa de conter a ação de militância subversiva.

Quanto maiores eram as delações premiadas, maiores eram os perdões judiciários concedidos pela justiça italiana. Assim, Cesare foi acusado e posteriormente condenado, à revelia, dos crimes delatados vingativamente por Mutti. Não restou alternativa que não fosse a fuga de seu próprio país.

Depois de vários anos exilado no México, Cesare muda-se para a França e por lá responde a um processo de extradição. Na época vigorava a chamada Doutrina Miterrand, cuja regra era a de conceder asilo político àqueles que haviam renunciado à luta armada. Cesare então passa a trabalhar como zelador de um prédio e desenvolve a profissão de escritor de romances policiais. Por mais paradoxal que possa parecer, finalmente, num primeiro momento, Cesare voltaria a ter uma vida normal, até que um dia é cercado por policiais e levado para uma penitenciária. Novamente ele responde a um processo de extradição cujo pedido formulado pelo governo italiano é julgado procedente.

Num sistema jurídico de qualquer país democrático do mundo, não se responde ao mesmo processo duas vezes. De nada adiantou os advogados de Cesare o tranquilizar dizendo que na França existia o direito, ao contrário da Itália. Novamente não haveria outra saída a não ser fugir.

O caso Cesare Battisti vem à tona no Brasil quando ele é preso pela Polícia Federal, em 2007, utilizando-se de um passaporte falso. Em 2009, o então Ministro da Justiça Tarso Genro lhe concede o asilo político, mas o governo italiano contesta e ajuiza um pedido de extradição no Supremo Tribunal Federal, que decide a favor do governo italiano mas ressalta que a decisão final compete ao Presidente da República. Hoje, no último dia do mandato de Lula, deverá constar do Diário Oficial da União a concessão de asilo a Cesare, após parecer da Advocacia Geral da União.

Não se trata de conceber Cesare como um coitadinho perseguido. Conforme podemos observar, diversos princípios elementares de direito foram lesados: houve uma delação premiada em troca de perdão político, tolheu-se o contraditório e a ampla defesa, respondeu-se ao mesmo processo de extradição por duas vezes e mesmo após a concessão de asilo político pelo Presidente Lula no último dia de seu mandato, pode ser que o caso volte a ser analisado pelo STF. Ora, se a própria suprema corte de direito brasileira decidiu que a palavra final é do Presidente da República, por que o caso deve ser analisado novamente? Fez-se a coisa julgada!

No mais, enquanto este blogue buscava notícias na internet sobre o caso em evidência neste artigo, foi descoberto que o ex-presidente italiano Francesco Cossiga (mandatário de 1985 a 1992), falecido no último mês de agosto, admitiu ter perseguido Cesare Battisti.

Portanto, não há mais o que discutir. Os inúmeros erros jurídicos propositais já foram cometidos, a perseguição política foi admitida e foi decidido que a palavra final era do Chefe do Poder Executivo do Brasil. Basta de injustiças! Feliz 2011 é com Cesare livre!
Durante as eleições, sob o argumento de querer oferecer aos seus leitores mais dados históricos da vida da candidata Dilma Rousseff, a Folha de São Paulo pediu, no Supremo Tribunal Militar, o desarquivamento do processo respondido pela petista durante a ditadura. Entretanto, quais seriam as verdadeiras intenções da Folha de São Paulo? Nunca é demais lembrar que este jornal emprestava veículos para a operação bandeirantes prender e torturar "subversivos", que publicou em sua capa uma ficha falsa de Dilma elaborada por neonazistas e chamou o período militar de ditabranda em um dos seus editoriais.

Os autos de um processo são públicos e podem ser vistos por qualquer pessoa, exceto se houver segredo de justiça, de tal forma que, a priori, não há nada demais em consultar o processo respondido por Dilma ou por qualquer outro cidadão infelizmente torturado. O grande problema é a versão e a opinião que jornalistas e colunistas da Folha darão sobre um depoimento tomado sob tortura e, por que não, num tribunal de exceção, afinal, Dilma e demais presos políticos respondiam por "crimes" cometidos por cidadãos comuns num órgão do poder judiciário destinado a julgar infrações cometidas por membros das Forças Armadas.

Também é de se suspeitar a inércia da Folha durante todo esse tempo, pois após publicar uma ficha falsa de Dilma, emprestar carros para a OBAN e chamar a ditadura de ditabranda, o desarquivamento do processo foi pedido em época de eleição.

Tornar público o processo respondido por Dilma é uma oportunidade de se acertar as contas com o passado. Um povo que não conhece a sua história está condenado a repetí-la, já dizia a célebre frase de autor desconhecido. Muitos torturadores de outrora hoje estão soltos e vivem como se nada tivesse acontecido, enquanto vários vizinhos nossos do cone sul continuam a condenar militares ex-ditadores por crimes de lesa pátria e lesa humanidade.

Antes de qualquer manchete ou coluna de jornal, primeiramente é preciso ouvir o que Dilma tem a dizer sobre o processo ao qual ela respondeu, por se tratar de um julgamento injusto feito num período de exceção. Por isso, qualquer comentário a respeito da Primeira Presidenta do Brasil que venha a difamar e macular sua trajetória não merece nenhum crédito, pois nas próprias palavras da Presidenta eleita, "não dá valor à democracia quem a compara com a ditadura".

Para saber mais sobre o assunto:

***BENTO XVI DÁ AS CARAS - DIFERENÇAS ENTRE O BRASIL E O VATICANO.


Se Dilma deixou de vencer as eleições no primeiro turno por causa da questão do aborto, não se pode afirmar. Porém, se a questão do aborto foi um dos impedimentos, pode ser que tenha sido. O que interessa é que há três dias do pleito eleitoral, o jornal que emprestava veículos para a Operação Bandeirantes na época da ditadura militar divulgou uma espécie de parecer do líder supremo católico que, na sua essência, orienta os líderes e fiéis de sua religião a se posicionarem politicamente contra qualquer projeto que defenda o aborto.

Pelo aborto ou contra o aborto? Eis a questão? Não, deixemos isso para depois. O fato é que o Vaticano é sim um Estado e a opinião camuflada do líder religioso a favor de José Serra, no sentido de dar a entender "não vote em Dilma porque ela defende o aborto", é uma grave ingerência internacional que fere o princípio da autodeterminação dos povos. Se o aborto será legalizado no Brasil ou não, isso é um assunto interno do qual o Vaticano não tem nada a ver.

No que se refere à pessoa, Bento XVI não tem qualquer moral para falar nada. Qual a credibilidade de alguém que foi membro da juventude hitlerista? Que julgou inquisitoriamente, à là idade média, vários teólogos da libertação que sentaram na mesma cadeira que Giordano Bruno e Galileu Galilei? Que se pronuncia contra o direito dos africanos usarem camisinha enquanto a África sofre com a AIDS? Joseph Ratzinger, ex-prefeito da Doutrina da Fé (algo como uma ala de extrema direita da igreja católica), deve se preocupar com as questões internas do seu Estado e não sobre o aborto no Brasil, que na verdade deve ser analisado sob a ótica da saúde pública, da ciência jurídica e da autodeterminação da mulher.

Entretanto, as incabíveis palavras do pontífice são uma oportunidade para recordarmos diversos aspectos acerca de um Estado que hoje, a partir do seu líder maior, tentou interferir veladamente (ou discaradamente) na discussão eleitoral brasileira.

Enquanto o Brasil é um Estado laico e sua lei maior é a Constituição de 1988, o Vaticano é um Estado de religião oficial cuja lei maior é a Bíblia. Enquanto no Brasil se vota para Presidente da República de quatro em quatro anos, no Vaticano o Papa é escolhido por um certo conselho restrito e somente deixa o cargo quando morre. Enquanto o Brasil é um país descoberto pelos portugueses, onde os índios de outrora aqui já habitavam, o Vaticano é um Estado criado pela igreja católica em 1929 a partir de um acordo, o Tratado de Latrão, feito com o líder máximo do fascismo, Benito Mussolini.

Ora, qual a moral então do ex-juventude hitlerista dizer como devemos avaliar a questão do aborto nessas eleições? Qual a moral deste impopular todo poderoso querer falar em orientação para se decidir sobre o aborto dentro de uma perspectiva democrática? Quem for a favor será excomungado? Terá cometido um delito de opinião?

O ponto de vista é a vista do ponto. A lamentável satanização pelo qual se viu a questão do aborto nessas eleições em nada somou para uma discussão construtiva sobre o tema. E as palavras de Bento XVI hoje divulgadas no jornal que oferecia veículos para a OBAN somente veio a banalizar a questão de uma vez por todas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário