Poucas vezes na história política
brasileira o velório de um homem público causou tamanha comoção popular e teve
uma cobertura midiática tão intensa quanto o de Eduardo Campos. Há várias
explicações para isso, entre elas o fato de a morte ter se dado de forma
trágica e ter interrompido subitamente uma
carreira política em ascensão. Eduardo tinha menos de 10% nas pesquisas para
presidente da República, mas em 2010 foi reeleito com 82% dos votos em
Pernambuco. Ou seja, em seu estado era uma liderança popular inconteste e todas as homenagens que recebeu hoje são, além de
merecidas, compreensíveis.
Ao mesmo tempo não se pode deixar de
perceber uma narrativa midiática claramente politizada do episódio. Vários
veículos de comunicação estão aproveitando o sentimento sincero de milhares de
pessoas para capitalizar politicamente. O UOL, por exemplo, tem como um dos
seus principais destaques desde cedo uma nota informando que Lula e
Dilma teriam sido vaiados no velório. O próprio texto informa que depois os
aplausos abafaram as vaias. Mas no título só há destaque para os apupos
negativos.
Na GloboNews também se criou um clima
de cobertura com toque oposicionista durante todo o dia. O jornalista Luis
Carlos Azenha que está em Recife aponta que entre outras coisas a emissora
escondeu a emoção de Lula.
Nas redes sociais, porém, o fato
político de destaque foi outro. A foto em que Marina Silva aparece ao lado do
caixão de Eduardo Campos sorrindo se tornou o meme do dia. O contexto da foto
não é claro, mas muitos consideraram aquele sorriso como sinal de desrespeito.
E um sinal de que ela estava feliz com o desfecho para a sua candidatura.
É preciso ter muito cuidado quando se
é pessoa pública. Todos seus gestos podem ser mal interpretados a partir de um
flagrante fora de contexto. No caso de Marina Silva, esse cuidado no velório de
hoje deveria ter sido redobrado, afinal ela se tornará herdeira da vaga de
Campos.
Dito isso, é preciso ser muito mal
intencionado para tentar instrumentalizar politicamente essa foto atribuindo à
candidata uma satisfação pela morte de Campos. Marina sorriu ao lado do caixão
como muitos de nós já devemos ter feito isso ao lado de entes queridos. Em
algum momento alguém conta uma história divertida do morto, fala de um momento
em que ele fez algo emocinante ou mesmo conta uma piada e as pessoas riem.
O ser humano também ri em enterros. E
isso às vezes é uma forma de homenagear aquele que se foi.
Marina terá uma campanha onde vai ter
de ser questionada sobre muitas coisas. Ela precisará deixar mais claro suas
posições a respeito da economia, de programas sociais, de obras na área
energética, de com quem pretende governar se eleita, até porque se elegerá por
um partido com o qual tem pouca identidade etc e tal. Mas tomara que não tenha
que ficar dando explicações sobre uma foto em que sorria ao lado de um caixão.
Tomara, também, que não busque fazer uso político da trágica morte de Eduardo
Campos. Nem uma coisa nem outra farão bem ao processo democrático.
Publicado no Contexto livre - Renato Rovai
Alfio Bogdan - Físico e Professor.
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