A tensão crescente entre
juízes e procuradores, de um lado, e Senado e Câmara de outro, tem quatro
fontes, alguma originalidade e nenhuma perspectiva de saída satisfatória para
os dois lados.
Se essa dificuldade de
conciliação pode significar agravamento e alargamento da crise, passando-a de
política e econômica para também institucional, é isso mesmo que se deve esperar.
E não para futuro distante.
As quatro fontes da discórdia
são os dez pontos, que a Câmara examina, sugeridos pela Operação Lava Jato para
combate à corrupção; os projetos contra abuso de autoridade e de acordos com
empresas corruptoras, ambos condenados pela Lava Jato e pela Procuradoria Geral
da República; e a iniciativa do presidente do Senado contra os supersalários,
que excedem o máximo legal no Executivo, no Legislativo e no Judiciário.
Em ao menos três dos casos, a
sensatez que se espera de quem fala pela Justiça está –é o máximo em
originalidade– exercida por congressistas, sendo um deles o contestado Renan Calheiros.
A Associação dos Juízes
Federais, por exemplo, tratou como ato contra a magistratura a criação, por
Renan Calheiros, de uma comissão para identificar onde estão e como se
constroem os supersalários nos Três Poderes.
Já por incluir governo e
Congresso, o ato resiste bem à crítica feita. Mas a reação se mostra ainda mais
torta quando se considera a legitimidade da iniciativa: nos funcionalismos das
três instituições, há salários (chamam-se vencimentos) que insultam o país.
Com ou sem truques, podem
estar todos baseados em regulamentos. Ainda assim, transgridem o máximo legal,
que é o salário de presidente da República. E isso precisa ser solucionado de
algum modo.
O clima
fervente no Poder Judiciário vem muito da incitação feita pelos procuradores da
Lava Jato e por Sergio Moro.
Tudo lhes é
permitido, logo, qualquer discordância com o emanado do grupo é mais do que
heresia: é, como diz Deltan Dallagnol, querer "a morte da Lava Jato",
quando não é defesa da corrupção.
Apesar dessas pressões, Onyx Lorenzoni,
deputado do DEM que só se fez conhecido por tomar chimarrão nas comissões com
televisão, está aproveitando
a oportunidade de fazer bem um trabalho importante e difícil.
Relator das dez
propostas da Lava Jato contra a corrupção, Lorenzoni faz acréscimos como a
possibilidade de que procuradores, juízes e promotores sejam processados por
crime de responsabilidade.
A Lava Jato é
exasperadamente contrária. Seus motivos não são misteriosos. Se, porém, ministros
do Supremo Tribunal Federal e o procurador-geral da República estão sujeitos a
tal processo, é injusto e incoerente que os demais juízes e promotores não o
sejam. Além disso, é nesses níveis que mais processos do gênero se
justificariam.
Lorenzoni propõe também a punição de manifestações
públicas de juízes sobre processos sem julgamento –o que leva a pensar logo em
Gilmar Mendes.
O teste que
consiste em fazer ofertas para averiguar a resistência à corrupção, no serviço
público, apenas foi atenuado. Uma pena: não muda o essencial, que é a
imoralidade e a covardia do ato, a que muitos honestos podem sucumbir por
desespero, e desgraçar-se.
Mas, entre muitas
modificações e acréscimos, foi entregue às baratas a proposta, ainda mais
imoral que a anterior, de tornar válido o uso de provas ilícitas "obtidas
de boa-fé". Mais do que uma proposta, aí se pode presumir uma confissão de
feitos ou de propósitos. E é admissível que de ambos.
A merecer repulsa, desde logo, são as manobras do deputado André
Moura no projeto para acordos de leniência (como a delação premiada, porém com
empresas).
Está evidente o seu objetivo e, portanto, do governo Michel
Temer, em três itens.
(1) - proibir que documentos empresariais
apresentados para acordo sejam usados por outros inquéritos.
(2) - anistiar o "caixa dois".
(3) - restringir às empresas a responsabilidade
pela corrupção, sem implicar diretores e donos.
Como empresa não faz corrupção, que é obra de
pessoas, já se sabe o que está por traz da pretensão do governo. A que custo, isso
não se sabe ainda.
Alfio Bogdan - Físico Professor e analista de acidentes de trânsito.
Fonte: Janio de Freitas ao 247 e Folha de S.Paulo
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