Norberto
Bobbio (1909-2004) foi um dos maiores politólogos (politicólogo) do século XX.
Dentre sua extensa obra, deixou uma importante contribuição à Ciência Política:
seu livro Teoria Geral da Política: a filosofia política e as lições dos
Clássicos. Este texto tentará abordar ligeiramente algumas considerações sobre
o conceito de política na visão desse autor.
A
palavra política deriva de politikós, do grego, e diz respeito àquilo
que é da cidade, da pólis (na Grécia Antiga), da sociedade, ou seja, que é de
interesse do homem enquanto cidadão. Já na Grécia Antiga, um dos primeiros a
tratar da política como uma prática intrínseca aos homens foi Aristóteles, com
seu livro A Política.
Ao longo
do tempo, o termo política deixou de ter o sentido de adjetivo (aquilo que é da
cidade, sociedade) e passou a ser um modo de “saber lidar” com as coisas da
cidade, da sociedade. Assim, fazer política pode estar associado às ações de
governo e de administração do Estado. Por outro lado, também diria respeito à
forma como a sociedade civil se relaciona com o próprio Estado.
Mas para Norberto Bobbio, falar em
política enquanto prática humana conduz, consequentemente, a se pensar no
conceito de poder. [ O poder estaria ligado à ideia de posse dos meios para se
obter vantagem (ou para fazer valer a vontade) de um homem sobre outros]. Assim, o poder político diria
respeito ao poder que um homem pode exercer sobre outros, a exemplo da relação
entre governante e governados (povo, sociedade). Contudo, ao falar em poder
político, é preciso pensar em sua legitimação. Podemos ter poderes políticos
legitimados por vários motivos, como pela tradição (poder de pai,
paternalista), despótico (autoritário, exercido por um rei, uma ditadura) ou
aquele que é dado pelo consenso, sendo este último um modelo de governo
esperado.
âO poder
exercido pelo governante em uma democracia, por exemplo, dá-se pelo consenso do
povo, da sociedade. No caso brasileiro, o poder da presidenta é garantido por
que existe um consenso da sociedade que o autoriza e, além disso, há uma
Constituição Federal que formaliza e dá garantias a esse consenso.á
Conforme nos mostra Norberto Bobbio
(2000), há uma tipologia moderna das formas de poder, como poder econômico,
poder ideológico e poder político, sendo que este último seria aquele no qual
se tem a exclusividade para o uso da força. Nas palavras de Bobbio (ibidem, p.
163), “o poder político, enfim, funda-se sobre a posse dos instrumentos através
dos quais se exerce a força física (armas de todo tipo e grau): é o poder
coativo no sentido mais estrito da palavra”. Contudo, Norberto Bobbio também
aponta que não é apenas o uso da força, mas sim seu monopólio, sua
exclusividade, que tem o consentimento da sociedade organizada. Em outras
palavras, será uma exclusividade de poder que pode ser exercida sobre um
determinado grupo social, em determinado território.
Outro aspecto importante para Bobbio
sobre a política é que sua finalidade ou seu fim não pode se resumir apenas em
um aspecto, pois “[...] os fins da política são tantos quantas forem as metas a
que um grupo organizado se propõe, segundo os tempos e as circunstâncias”
(ibidem, p. 167). Porém, um fim mínimo à política (enquanto poder de força) é a
manutenção da ordem pública e a defesa da integridade nacional. Essa finalidade
é mínima para a realização de todos os outros fins do poder político. Porém, é
importante se atentar para o fato de que o poder político não pode ter como
finalidade o poder pelo poder, pois se assim fosse perderia o sentido.
Norberto Bobbio, citando Carl Shmitt,
também fala da ideia de política como relação amigo-inimigo, dizendo que “o
campo de origem e de aplicação da política é o antagonismo, e sua função
consistiria na atividade de agregar e defender os amigos e de desagregar e
combater os inimigos” (ibidem, p. 170). No debate de ideias para se pensar a
ordem social, essa oposição é fundamental, contudo, apenas esse nível de
antagonismo pode ser tolerado pelo Estado, uma vez que a extrema divisão ou
situação de conflito entre aqueles que compõem uma sociedade poderia levar ao
caos.
No exercício de compreensão do conceito de política, deve-se considerar que na filosofia política moderna aquilo que é político não necessariamente coincide com o social, pois, ao longo da história, as outras esferas da vida foram se separando do Estado, a exemplo do poder religioso e do poder econômico. Na visão de Bobbio, a política restringe-se à esfera do Estado, instituição esta responsável pela ordem social. Para Bobbio, “enquanto a filosofia política clássica está alicerçada sobre o estudo da estrutura da pólis e das suas várias formas históricas ou ideais, a filosofia política pós-clássica caracteriza-se pela contínua tentativa de uma delimitação daquilo que é político (o reino de César) em relação àquilo que não é político (seja ele o reino de Deus ou o reino das riquezas), por uma contínua reflexão sobre aquilo que diferencia a esfera da política da esfera da não política, o Estado do não Estado...” (ibidem, p. 172).
O processo de emancipação da sociedade no sentido de seu “funcionamento” sem a presença do Estado poderia levar ao fim da política enquanto ação coercitiva para coesão social. Em outras palavras, se a sociedade conseguisse manter sua ordem sem o poder político (que usa da força), ela não precisaria mais do Estado.
Nesse mesmo livro, Bobbio também fala da relação entre política e moral, uma vez que ambas estão ligadas à ação (à práxis) humana. Porém, aquilo que fundamenta ou motiva, ou aquilo que é permitido ou proibido, nem sempre tem o mesmo sentido para a política e para a moral. Segundo Bobbio, pode haver “ações morais que são impolíticas (ou apolíticas) e ações políticas que são imorais (ou amorais)” (ibidem, p. 174), distinção esta que, aliás, já se fazia presente na obra de Nicolau Maquiavel. Dessa forma, seria preciso considerar que existem razões e ações do Estado que são justificadas quando por ele praticadas, mas jamais permitidas a um indivíduo. A política seria a razão do Estado, enquanto a moral seria a razão do indivíduo. Assim, seria preciso pensar na autonomia da ação política, a qual é motivada por razões que não são as mesmas da ação individual.
Em suma, dessa breve explanação sobre alguns aspectos da obra citada de Norberto Bobbio, pode-se inferir que, em linhas gerais, sua posição tenta compreender a política como “atividade ou conjunto de atividades que têm de algum modo, como termo de referência, a pólis, isto é, o Estado” (ibidem, p. 160).
https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/ideia-politica-norberto-bobbio.htm.Alfio Bogdan - Físico e Professor.
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