PUBLICADO EM 24/08/2021
O
Grupo Prerrogativas, que reúne juristas, professores de Direito e profissionais
da área jurídica repudia a tese do “marco temporal”, que pretende que
comunidades indígenas apenas possam requerer e reivindicar espaços e terras que
já ocupavam na data da promulgação da Constituição Federal, ou seja, em 5 de
outubro de 1988.
Essa tese, sabe-se, é defendida pela
bancada ruralista e por empresários do setor agropecuário.
Diante de uma história de ocupação do
espaço de mais de 500 anos, iniciada muito antes da consolidação do Estado
nacional, a Constituição de 1988, em sua busca radical por igualdade e
diversidade, reconheceu aos indígenas direitos originários às terras que
tradicionalmente ocupam (art. 231, caput). Ou seja, assegurou direitos que
remontam ao período da conquista, mas as terras são aquelas tradicionalmente
ocupadas, essenciais à conservação da própria cultura.
A contraposta e equivocada tese do “marco
temporal” simplesmente ignora os povos que foram destituídos de suas terras,
por meio de violência ou em decorrência da expansão rural e urbana. Seriam
esses povos carentes de direitos, exatamente no contexto de uma Constituição
que enfrenta o seu passado colonial e se propõe a superá-lo? Numa Constituição
que reconhece a igual dignidade de pessoas e dos diversos grupos formadores da
sociedade nacional?
O fato insuperável é que os espaços de
terra que na atualidade são alvo de litígios judiciais foram incorporados
através de procedimentos de colonialismo interno. A disciplina legal agrária e
civil foi organizada sobre representações distintas a respeito de lugares e de
suas concepções, que voltam agora a ser fundamentais, uma vez que a
Constituição determina que as terras tradicionalmente ocupadas por indígenas
sejam analisadas à vista de seus “usos, costumes e tradições” (art. 231, § 1º).
O caso Raposa Serra do Sol, primeiro a
consagrar a chamada tese do “marco temporal”, está cercado de particularidades
e foi reconhecido como singular pelo próprio STF ao julgar os embargos de declaração
deduzidos em face do primeiro julgamento. Mas foi conferida repercussão geral
ao RE 1.017.365-SC, de modo a que o STF estabeleça, em definitivo, o regime
constitucional das terras indígenas.
O Grupo Prerrogativas segue confiante em
que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento que vai ocorrer nessa semana,
fará prevalecer o sentido pleno da Constituição, de assegurar aos indígenas os
direitos originários às terras que tradicionalmente ocupam, independentemente
de quaisquer marcos ou condicionantes de caráter infraconstitucional.
Alfio Bogdan - Físico e Professor - analista ema cidente de trânsito
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