quinta-feira, 30 de maio de 2013

CAPITULO I - SOCIALISMO SEGUNDO NORBERTO BOBBIO

Socialismo segundo Norberto Bobbio

A base comum das múltiplas variantes do Socialismo pode ser identificada na transformação substancial do ordenamento jurídico e econômico fundado na propriedade privada dos meios de produção e troca, numa organização social na qual: a) o direito de propriedade seja fortemente limitado; b) os principais recursos econômicos estejam sob o controle das classes trabalhadoras; c) a sua gestão tenha por objetivo promover a igualdade social (e não somente jurídica ou política), através da intervenção dos poderes públicos. ►O termo e o conceito de Socialismo andam unidos desde a origem com os de COMUNISMO (V.), numa relação mutável que ilustraremos sinteticamente.

Embora tenham sido usadas às vezes para designar, por exemplo, o contratualismo por escritores italianos do século XVIII e do início do XIX (F. Facchinei, A. Buonafede, G. Giuliani), |as palavras "socialismo" e "socialista" adquiriram seu sentido moderno nos programas de cooperação entre os operários e nos de gestão comum dos meios de produção propugnados pelos owenianos na segunda metade da década de 1820-1830, sendo, em seguida, largamente empregados, neste sentido na década seguinte, na Inglaterra e na França: o órgão oweniano "The New Moral World" admitia a expressão "organ of socialism" em fim de 1836; em 1841, R. Owen escrevia o opúsculo O que é o Socialismo? E o sansimoniano P. Leroux contrapunha o Socialismo ao individualismo no artigo sobre o individualismo e o Socialismo, publicado em 1833, na "Revue enciclopédique"; nos mesmos anos "Socialismo" era usado pelos fourieristas como sinônimo de "escola societária". Em 1835, o estudioso francês L. Reybaud publicava na "Revue des deux mondes" uma série de artigos, reunidos depois sob o título Estudos sobre reformadores ou socialistas modernos (Paris, 1842- 1843), e o alemão L. von Stein publicava em 1842, em Leipzig, Socialismo e comunismo na França de hoje, uma obra que, embora crítica em relação às doutrinas socialistas, contribuía notavelmente para a sua difusão na Alemanha. No fim da década de 1830 começava a ser usado na França, por E. Cabet e outros, o termo "comunismo" como equivalente a "Socialismo" ou a "comunitarismo". Mas na década de 1840, as palavras "comunismo" e "Socialismo" acabaram, pelo menos em parte, por indicar variações diversas do movimento que denunciava as condições dos operários no desenvolvimento da sociedade industrial, se opunha ao liberalismo político e econômico e ao individualismo, apresentava um projeto de uma reconstrução da sociedade em bases comunitárias e promovia formas associativas de vário gênero (sindicais, políticas, experiências cooperativistas e comunitárias) para realizar as novas idéias

Prova desta divergência de significados é a declaração de F. Engels no prefácio ao Manifesto do partido comunista, escrita para a edição inglesa de 1888 (e repetida com palavras quase idênticas na edição alemã de 1890): "Em 1847, se apontavam como socialistas, de um lado, os seguidores de diversos sistemas utópicos: discípulos de Owen na Inglaterra, de Fourier na França, uns e outros já reduzidos ao estado de simples seitas em vias de gradual extinção; de outro lado, os charlatanismos sociais mais diversos. .. em ambos os casos, tratava-se de homens alheios ao movimento operário que procuravam mais que tudo o apoio das classes 'instruídas'. Toda a fração da classe operária que se  tinha convencido da insuficiência das revoluções  unicamente políticas e proclamara a necessidade de uma transformação geral da sociedade, se dizia comunista. Era um tipo de comunismo grosseiro, apenas esboçado, puramente instintivo; visava, todavia, ao essencial e teve força suficiente entre a classe operária para dar origem ao comunismo utópico, ao de Cabet na França e ao de Weitling na Alemanha.
Portanto, em 1847, o Socialismo era um movimento burguês, o comunismo um movimento da classe operária".
Afastada, com o fracasso da revolução de 1848, a possibilidade de pôr em prática os programas socialistas, na segunda metade do século XIX, a contraposição de significados entre "Socialismo" e "comunismo" perdeu importância: o problema principal era o de constituir organizações operárias autônomas e de obter para elas o reconhecimento dos direitos elementares de associação e de imprensa, a ampliação do direito de voto para além dos limites consitários dos ordenamentos liberais, o direito à greve e à contratação sindical. "Associação internacional dos trabalhadores" se chamou à Primeira Internacional, fundada em 1864, e partidos "operários", "socialistas", "social-democráticos", "laboristas", às organizações políticas dos trabalhadores que surgiram, em bases nacionais, a partir dos anos de 1870 e se coligaram através da Segunda Internacional, nascida em 1889.

Com a desintegração da frente socialista na Primeira Guerra Mundial e a revolução de 1917 na Rússia, o contraste entre "Socialismo" e "comunismo" foi reatualizado pelo leninismo: o partido bolchevique assumiu a denominação de Partido Comunista (bolchevique) em 1918, invocando polemicamente o
conteúdo revolucionário original do Manifesto e o rompimento com as posições reformistas majoritárias nos partidos socialistas europeus.
Alfio Bogdan

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