segunda-feira, 18 de março de 2013

RESPONSABILIDADE DE QUEM?


RESPONSABILIDADE DE QUEM ?
Fábio Konder Comparato 17/03/13

Colocação assaz interessante do Prof. Comparato sobre a responsabilidade do Estado argentino e a Igreja a ele associada no período mais triste de recente ditadura.

|—> A discussão a respeito do prolongado silêncio do atual Papa em relação os crimes de terrorismo de Estado na Argentina, cometidos durante o regime empresarial-militar de 1976 a 1983, merece uma reflexão à luz da história do cristianismo.

São Paulo, ele próprio cidadão romano e grande propagador da fé cristã no vasto território do império dos Césares, em carta dirigida justamente aos cristãos residentes em Roma (capítulo 13, versículos 1 e 2), ordenou:

Todo homem se submeta às autoridades constituídas, pois não há autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram estabelecidas por Deus. De modo que aquele que se revolta contra a autoridade, opõe-se à ordem estabelecida por Deus. E os que se opõem atrairão sobre si a condenação.

Esse mandamento tem sido incessantemente observado pelas autoridades eclesiais nas várias igrejas cristãs, em todos os tempos e lugares, qualquer que seja o regime político, ainda que altamente criminoso⟫. |—> No século XX, por exemplo, a Igreja Católica colaborou oficialmente, por meio de concordatas ou mesmo da união política, com o fascismo italiano e espanhol, com o Estado nazista na Alemanha e em outros países por ela dominados. As inúmeras ditaduras latino-americanas, desde o século XIX, salvo raríssimas exceções, contaram com o apoio oficial do Vaticano.

|—> Ora, na Argentina existe de há muito a união política oficial da Igreja com o Estado. O atual papa, lá, foi o provincial (ou seja, o chefe local) dos jesuítas, entre 1973 e 1979, antes de ser nomeado arcebispo e depois Cardeal de Buenos Aires. Ou seja, exerceu a autoridade eclesiástica durante todos os anos tenebrosos do regime, de terrorismo de Estado, nos quais foram exterminados pelo menos 30.000 opositores políticos, e exiladas cerca de 1.200.000 pessoas.

|—> Pois bem, não se trata de saber se, alguma vez, Dom Bergoglio, agora Papa Francisco, colaborou explicitamente com atos hoje qualificados como crime contra a humanidade; tais como o assassínio de opositores políticos (com ou sem desaparecimento do cadáver), as sessões de tortura (com ou sem mutilações), ou o seqüestro e a entrega a estranhos de recém-nascidos, cujos pais foram exterminados. |—> O que importa, perante a consciência ética universal, é saber se, alguma vez, o atual Sumo Pontífice manifestou publicamente o seu protesto contra todos esses horrores.

|—> Durante o governo dos dois Kirchner, o então Cardeal de Buenos Aires não deixou de condenar duramente a oficialização do aborto, do casamento de homossexuais e das medidas de controle da natalidade. |—>Tais atos seriam, porventura, mais imorais do que aquele conjunto de atrocidades cometidas durante sete anos pelos sucessivos governos do regime empresarial-militar?

|Ω|—>Uma coisa, porém, é incontestável. |—> Se a Igreja Católica estava oficialmente unida ao Estado durante aquele regime – assim como permanece unida até hoje –, as vítimas dos atos de terrorismo estatal têm o direito de agir em juízo, conjuntamente contra o Estado e a Igreja Católica, pleiteando a justa indenização pelos terríveis danos sofridos
Fonte: CAf. PHA

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